Este é talvez o maior desafio para promover a inovação que o Brasil e o mundo precisam
Jaqueline Weigel
Começo este texto pensando alto e lançando um convite para reflexão: será que é mesmo possível transformar o sistema corporativo linear em um modelo disruptivo e exponencial?
Nos estudos sobre futurismo, inovação disruptiva e a era digital inúmeros são os debates. Há dúvidas por todos os lados sobre qual é o melhor caminho para adaptar os negócios tradicionais aos novos modelos competitivos e descentralizados. A inovação tomou conta dos debates.
Sistema linear x sistema exponencial
Muitas empresas de grande porte apostam em startups internas ou decidem mandar comitivas para o Vale do Silício em busca de respostas sobre o caminho a seguir. Observando o mercado brasileiro, por vezes tenho a impressão de que há uma trilha incompleta, que muitas vezes começa pelo que pode ser o final da jornada.
Inovar de maneira ousada não é um hábito consolidado em nossos ambientes de negócio, e agora virou condição de sobrevivência. A disrupção não virá de dentro e sim de fora, e de direções completamente inesperadas. O concorrente do seu segmento não é mais sua maior ameaça.
Executivos procuram respostas para seus negócios e direções para suas carreiras pessoais sobre como jogar este novo jogo do mercado e como encontrar um lugar de valor no futuro emergente.
A resposta não é simples e talvez sequer exista. Muitos caminhos estão sendo testados e a maioria tem fracassado. Algumas iniciativas devem mostrar os efeitos colaterais em breve e talvez sejam desastrosos.
Inovar hoje está muito além de promover hackatons ou de servir de garagem para que millennials tenham ideias surpreendentes. Inovar começa por mudança de mindset de quem está frente dos projetos e tem o desafio de manter o que existe enquanto o novo toma forma.
Transformação de sucesso
Existem várias possibilidades para uma transformação de sucesso.
Uma delas é equilibrar o ambiente enquanto é promovida internamente a construção do pensamento exponencial, a identificação dos elementos disruptivos internos do organismo corporativo e então fazer com que estes sejam acompanhados por mentores e disruptores externos para que criem novas unidades de negócio.
Não existe uma loja onde se compra a disrupção pronta replicável em escala ou no modelo que seu negócio precisa.
Outra forma de pensar na transição é manter o que existe em sua melhor versão e começar algo novo em paralelo, que aos poucos pode ir tomando o lugar do que já existe e garantir em médio prazo a participação da empresa no jogo do mercado digital.
Lutar contra o status quo não ajuda a modificá-lo! Mudar o que está firmemente consolidado em bases lineares não é tarefa fácil, e talvez não seja mesmo possível.
Pessoas e sistemas criam imunidade natural à qualquer provocação de mudança. Robert Keagan chama este efeito de Imunidade à Mudança. É ela que nos impede inconscientemente de trabalhar em objetivos desejados. Servimos à hipóteses que na verdade nos levam diretamente àquilo que desejamos evitar a qualquer custo.
Assim acontece nas organizações. John Hagel nos ensina sobre o sistema imune da inovação, que tem em sua grande maioria, os executivos do board, que desejam a mudança mas não suportam ameaça aos status atual que os mantém no topo.
Acabam discretamente sabotando a inovação, junto com seus glóbulos brancos: suas áreas de TI, RH e departamentos jurídicos onde nada é possível sem uma infindável burocracia.
Contra os sistemas de imunidade, é preciso estratégia, leitura das entrelinhas, sabedoria e maestria. É aqui que as transformações digitais podem estar fracassando. Estamos pulando etapas.
Adaptar é diferente de nascer digital. Não pode haver uma implantação interna de sucesso se a equação do atual com o novo não estiver entrelaçada, adaptada , preparada ou blindada.
O sistema corporativo linear por si só é lento e caótico. Submetido a células de inovação que emitem sons de ameaça, o caos aumenta e o negócio pode sofrer colapsos.
Percebo que o grupo diretivo dos negócios tradicionais pensa muito pouco nas emoções que suas decisões criam no ambiente, e que acabam se tornando impactos nocivos ao negócio.
Liderança feminina
Segundo Salim Ismail, o arquétipo da próxima década é feminino justamente por isso. O modelo mental masculino é capitalista, pragmático e cartesiano demais, e criou o sistema colapsado que conhecemos. As pessoas estão se demitindo do mundo corporativo porque ficou insuportável.
Cuidado, preparo, antevisão, diplomacia, estratégia são habilidades absolutas para construir mudanças sustentáveis. Separar os assuntos pode ser uma boa estratégia: olhar para o organismo vivo, equilibrá-lo, inovar fazendo adaptações para torna-lo híbrido, e em paralelo, criar o novo, que vai tomando forma e ganhando consistência, e pode ocupar um espaço ou suprir uma ameaça para a existência do negócio atual.
Precisamos ter pessoas capazes de segurar e equilibrar o que hoje ainda existe nas empresas. Precisamos de pessoas capazes de navegar em modelos híbrido se incertos.
E precisamos de pessoas disruptivas que criem novos negócios, conectados aos atuais ou não, mas que sirvam o mundo futuro melhor do que as empresas que até agora pensaram demais em metas e muito pouco nos clientes e na sociedade que investe em seus produtos.
Transformação digital
Tenho dúvidas sobre a real possibilidade de realizar uma transformação digital de sucesso. Seria como tentar transformar o antigo Fusca em Tesla. Será que é possível com o princípio sendo tão diferente?
Com o tempo saberemos. Só espero que não joguemos fora tempo, energia e recurso copiando modelos que em outros países podem ter tido sucesso mas que aqui precisam ser adaptados.
Precisamos formar pessoas com pensamento exponencial, que criem cultura exponencial, e só então seremos capazes de promover a inovação que o Brasil e o mundo precisam.
Na evolução do mundo, é natural que o novo se consolide aos poucos até tornar o antigo obsoleto. Neste momento de transição, há mensagens ambíguas para os homens de negócio: inovem sem hesitar, mas não o façam de qualquer forma, ou a própria inovação poderá ser a causa da morte prematura do negócio.
Texto publicado no site Futuro Exponencial